Acertando pontos na minha cabeça.
Quando ganhei coragem de nos submeter a esta TEC, sim coragem, é preciso coragem, para enfrentar cada etapa dos meus problemas ginecológicos e da consequente infertilidade, tinha um grande medo de não passarmos da descongelação. Melhor, para mim era certo que o nosso pequeno guerreiro não iria passar da descongelação, porque afinal de contas é um processo muito agressivo para um microscópico embrião. Apesar da minha área de formação ser a das ciências, não consigo deixar de achar este processo um verdadeiro milagre!
Na manhã da descongelação o meu marido, à semelhança do que aconteceu na ICSI, levou o meu telemóvel e acabou por ser ele a ligar para a IVI, para saber o que se passava, dado que estranhávamos a ausência de notícias. Ficámos espantados quando nos disseram que tínhamos um bonequinho de neve "vivo" e de boa qualidade, claro que é um B, portanto boa qualidade para um B e de 6º dia, mas até estava bonito! Confesso que aqui senti muita esperança! Da outra vez o nosso "cisto" era um bocadinho feio, benza-o Deus, apesar de ser muito muito amado, muito desejado e muito nosso e de ter sido fulcral na nossa vida, pois sem ele tinha sido terrível suportar um ciclo sem transferência. A verdade é que nunca senti a esperança que senti naquela sexta-feira. Seguimos para Lisboa, e a transferência fez-se, bebi apenas dois copos de água, mas custou-me muito, mais uma vez, aguentar a bexiga, para a próxima só beberei um copo de água. A pressão que a assistente do Dr. fazia na bexiga com a sonda do ecógrafo, fez-me em determinada altura morder o dedo, para vocês perceberem ao que me refiro! No final da transferência, o meu marido perguntou ao médico o que achava, em termos de hipóteses, deste embrião para o outro e aí, puff! Chapadão mesmo em cheio de volta à realidade! O médico disse que apesar de morfologicamente mais interessante, este blastocisto tinha demorado mais um dia a chegar a este estado, logo não haveria grandes diferenças em termos de taxas de sucesso. Balde gigante de água fria, mas, claramente, necessário.
Consegui apenas cerca de vinte minutos de repouso, contados pelo relógio, aquelas mudanças todas de mesa de cirurgia para maca e de maca para cama na IVI deviam ser revistas, aquilo não pode ser bom! Eu sei lá fazer força com os cotovelos para mudar de um sitio para o outro, acho que faço força na barriga e, ao contrário do que se pensa muitos embriões não ficam no útero após a transferência, é um jogo de probabilidades
(Mansou, R., Minimizing embryo expulsion after embryo transfer: a randomized controlled study, Human Reproduction, Volume 20, Issue 1, 1 January 2005, Pages 170–174).
No dia da transferência e no dia seguinte senti real desconforto uterino e ovárico, que desapareceu por completo. Aguardo mais uma vez o beta em casa. Devido ás características do meu trabalho, não posso trabalhar a seguir a uma transferência de embrião e tenho muito mais tempo para pensar, o que não pode ser bom. Sábado e domingo já vou trabalhar e na segunda-feira faço o beta. O terrível é este sentimento, a certeza que tudo por esta altura está decidido,e que em momento algum há ou houve alguma coisa que pudesse fazer. Esta sensação de impotência e ver o sofrimento que a minha doença me causa não só a mim, mas ao meu marido não é nada fixe. Eu sei que não tenho culpa de ter endometriose, mal seria, mas esse reconhecimento não torna as coisas mais simples, mais fáceis.
Tento pensar positivo, mas vejo as coisas muito complicadas, pois é certo que foi apenas a primeira FIV, mas não é certo que haja uma segunda, é até bastante provável que havendo uma segunda não haja embriões para transferir, com toda a certeza não existirá uma terceira e nessa altura teremos a doação de ovócitos como opção, se Deus quiser!
Por enquanto, vou então fazendo isso do tentar pensar positivo, que é uma coisa muito em voga, embora o sexto sentido me diga que não adianta, acho que uma mulher sabe... Tentando ver além da infertilidade, tudo o que a vida nos reserva! Ontem à noite quando passeava a cadela, senti o frio no rosto e o cheiro de lenha a arder vinda de algumas chaminés, que logo me levou para o Novembro passado e para a maravilhosa Praga, para o quanto fomos felizes lá, para o cheiro do vinho e da cidra quente e do trdelnik acabado de fazer, porque há vida e felicidade além da infertilidade,desde que haja amor e isso felizmente não falta cá em casa!